
Moçambique Enfrenta Riscos Sistémicos de Branqueamento de Capitais e Financiamento ao Terrorismo: Relatório Aponta Fragilidades Estruturais, Deficiências Regulatórias e Consequências Económicas
Questões-Chave:
- EY Moçambique propõe base de dados nacional para garantir a rastreabilidade e responsabilização das ONG;
- Corrupção sistémica, tráfico de drogas e a informalidade do sector imobiliário expõem o país a riscos de lavagem de dinheiro;
- Relatório reconhece ausência de provas sobre uso directo de ONG em actos ilícitos, mas alerta para fragilidades de controlo;
- Impacto reputacional ameaça o acesso de Moçambique a financiamento externo, apoio internacional e fluxos de investimento;
- País procura reforçar a legislação e a supervisão como parte do esforço para sair da lista cinzenta do GAFI.
Apesar dos progressos institucionais, Moçambique continua a apresentar vulnerabilidades críticas face ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. O mais recente relatório da EY Moçambique, apresentado em 2024, lança um alerta contundente sobre a fragilidade dos mecanismos de controlo e supervisão, num contexto em que o país tenta recuperar a confiança internacional e reverter o seu estatuto na lista cinzenta do GAFI. O impacto directo destas fragilidades reflecte-se não só na segurança financeira, mas também na reputação externa, no volume de investimento e na capacidade de resposta do Estado social.
Uma Vulnerabilidade Sistémica com Implicações Económicas e Políticas
A crescente complexidade dos fluxos financeiros internacionais e o enraizamento de redes ilícitas em sectores económicos vulneráveis colocam Moçambique sob pressão. A EY Moçambique reuniu em Maputo peritos forenses, auditores e representantes da sociedade civil para discutir os factores que continuam a expor o país a esquemas de branqueamento de capitais e financiamento de actividades ilícitas, incluindo o terrorismo.
Entre os sectores mais expostos encontram-se:
- O mercado imobiliário, com a aquisição de terrenos a preços aviltados e construção de empreendimentos com valores incompatíveis com os rendimentos declarados;
- O comércio informal de viaturas de luxo, apontado como “lavatório financeiro” recorrente;
- As campanhas políticas e leilões partidários, onde bens simbólicos são adquiridos por milhões de meticais sem qualquer escrutínio sobre a proveniência do dinheiro.
Estas práticas contribuem para alimentar uma economia paralela, baseada na opacidade, na não tributação e na erosão da confiança pública nas instituições, dificultando igualmente a fiscalização por parte das autoridades financeiras e judiciais.
ONG e a Falta de Rastreabilidade
Embora o relatório não apresente provas de que as Organizações da Sociedade Civil (OSC) estejam directamente envolvidas em esquemas ilícitos, é inequívoca a crítica à falta de uma base de dados nacional que permita o controlo efectivo sobre os seus planos de actividade, fontes de financiamento e práticas de prestação de contas.
“Queremos que as ONG tragam voluntariamente a sua informação financeira, operacional e institucional. Isso permitirá melhorar a sua credibilidade e proteger a sua legitimidade”, afirmou Lúcio Guente, da EY.
A activista Fátima Mimbire reforça a necessidade de responsabilização do Estado, que, segundo a lei, deve garantir que todas as entidades estejam devidamente registadas e cujos dados sejam públicos. A falta de acesso aos registos comerciais, mesmo por jornalistas ou investigadores, constitui uma violação da legislação vigente, e compromete os princípios de transparência que sustentam qualquer democracia funcional.
Quadro Regulatório e Pressões Externas
O relatório salienta que a legislação moçambicana sobre branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo necessita de actualizações e reforço de aplicação. A existência de normas sem mecanismos eficazes de implementação e de fiscalização torna os riscos ainda mais agudos.
Francisca Neves, sócia da EY, alerta que a fraca capacidade institucional pode impedir que fundos doados por parceiros internacionais cheguem aos seus destinatários legítimos, criando um ciclo de desconfiança e retração de apoios:
“A reputação de Moçambique como destino de fundos internacionais está em risco. Isso afecta o financiamento à saúde pública, à educação e à protecção social – pilares do desenvolvimento humano”.
Para além da dimensão interna, a manutenção de Moçambique na lista cinzenta do GAFI compromete seriamente a classificação de risco-país, eleva o custo da dívida externa e limita o acesso a crédito internacional. Ao mesmo tempo, os parceiros multilaterais tornam-se mais exigentes, e investidores privados mostram maior hesitação em entrar no mercado.
Corrupção e Crime Organizado: Um Duplo Risco
O relatório é ainda mais incisivo ao apontar a corrupção e o tráfico de drogas como vectores primários do sistema de branqueamento de capitais. A narrativa pública de Moçambique como “narco-Estado” tem vindo a ganhar força, e os dados que sustentam essa percepção são alarmantes. A desarticulação entre a justiça, as forças de segurança e os órgãos de fiscalização financeira permite que milhões de meticais entrem no sistema financeiro sem rastreabilidade, através de mecanismos que passam despercebidos às autoridades.
“Quando uma caneta é vendida por um milhão de meticais num evento partidário, isso é um sinal gritante de branqueamento”, denuncia um dos peritos citados no relatório.
Estas práticas não só deformam o mercado como corroem a legitimidade do Estado, afastando investimento produtivo e minando as bases do desenvolvimento sustentável.
A luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento ao terrorismo em Moçambique exige mais do que reformas pontuais: exige uma transformação estrutural no funcionamento das instituições, na cultura política e na forma como o Estado se relaciona com os seus cidadãos e com o mundo. O custo da inércia é elevado: perda de credibilidade, fuga de capitais, erosão fiscal e aumento do risco sistémico. O país está, mais uma vez, diante de uma encruzilhada — e o momento de actuar é agora.
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