Venâncio Mondlane marca regresso em meio à maior contestação pós-eleitoral desde 1994

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Venâncio Mondlane, ex-candidato presidencial moçambicano e líder da contestação aos resultados das eleições gerais de 9 de Outubro, anunciou que regressará ao País na quinta-feira, 9 de Janeiro. O anúncio foi feito no Domingo, 5 de Janeiro, através de um directo na sua página oficial do Facebook, onde Mondlane lançou duras críticas ao Governo e apelou à população para o receber no Aeroporto Internacional de Maputo.

Mondlane, que está fora do país desde 21 de Outubro alegando ameaças à sua segurança, descreveu a sua volta como o início de uma nova fase de luta, que denominou “Ponta de Lança”. “Estão a matar os meus irmãos, estão a sequestrar os meus irmãos. Se quiserem-me assassinar, assassinem. Se quiserem prender-me, prendam. Sei que na minha queda a fúria popular que se vai verificar em Moçambique não tem comparação na história de África e de Moçambique”, declarou, reforçando o tom de confronto directo com o Governo.

O ex candidato explicou que a sua ausência teve como objectivo coordenar, a partir do exterior, as manifestações e protestos contra o que considera ser a “mega fraude eleitoral” de Outubro. “O papel que eu tinha de desempenhar fora de Moçambique, para que as manifestações pudessem ser organizadas e avançassem, foi cumprido”, afirmou Mondlane, sublinhando que a sua decisão de regressar está alinhada com a continuidade da contestação.

Contexto eleitoral e escalada de tensão

Os resultados das eleições gerais de 9 de Outubro foram oficialmente anunciados pelo Conselho Constitucional (CC) a 23 de Dezembro, confirmando Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frelimo, como vencedor das presidenciais, com 65,17% dos votos. Chapo, descrito como uma proposta jovem, será o primeiro presidente moçambicano nascido após a independência. Ele sucede Filipe Nyusi num momento em que Moçambique celebra 50 anos de independência, um marco ensombrado pela contestação generalizada.

Venâncio Mondlane, que segundo o CC obteve 24% dos votos, rejeitou os resultados e declarou vitória, acusando o processo de ser marcado por irregularidades e manipulação. A proclamação oficial intensificou os protestos nas ruas, com milhares de apoiantes de Mondlane a exigir a reposição da “verdade eleitoral”. Os protestos degeneraram em violência, com registo de barricadas, saques e confrontos diretos com a polícia, que usou força letal para dispersar manifestantes. Segundo organizações da sociedade civil, os confrontos resultaram em quase 300 mortos e mais de 500 feridos por disparos desde Outubro.

Enquanto o Tribunal Supremo garantiu que não há mandados de captura contra Mondlane, o Ministério Público abriu processos contra o candidato, acusando-o de ser autor moral de prejuízos no valor de mais de dois milhões de euros devido à destruição de património público e privado em Maputo e noutras províncias. Apesar destas acusações, Mondlane mantém a sua postura desafiante e rejeita qualquer possibilidade de abandonar a sua luta.

Divisões internas na oposição

A contestação eleitoral também expôs fissuras dentro da oposição. Venâncio Mondlane acusou Albino Forquilha, Presidente do Partido Podemos – que apoiou a sua candidatura – de violar um acordo pré-eleitoral ao admitir a posse dos deputados eleitos pelo partido. Mondlane considerou esta decisão uma “traição” e apelou à liderança do Podemos para reverter a posição, sob o risco de comprometer a luta pela reposição da verdade eleitoral.

Por sua vez, o partido Podemos negou qualquer afastamento de Mondlane e sublinhou que as decisões tomadas visam proteger os interesses do povo moçambicano. No entanto, as divergências internas podem enfraquecer a capacidade de articulação da oposição num momento crítico para o futuro político do país.

Com a proclamação dos resultados, o Podemos assumirá o estatuto de maior partido de oposição no parlamento, destronando a Renamo, que ocupava essa posição desde as primeiras eleições multipartidárias em 1994. Contudo, a tomada de posse dos deputados eleitos está envolta em incertezas, com críticas internas e externas a ameaçarem a unidade da oposição.

Impacto do regresso de Mondlane

O regresso de Venâncio Mondlane ocorre numa altura de elevada tensão política e social. Com a cerimónia de tomada de posse de Daniel Chapo marcada para 15 de Janeiro, o regresso do principal opositor do processo eleitoral pode reacender os protestos e desestabilizar ainda mais a situação no país. Mondlane apelou à população para o receber em massa no aeroporto de Maputo, num gesto que visa demonstrar a força do movimento de contestação.

A instabilidade política e os protestos violentos têm afectado significativamente a imagem de Moçambique no exterior, com potenciais impactos negativos no investimento estrangeiro e na cooperação internacional. O Governo enfrenta o desafio de gerir a crise enquanto tenta avançar com a transição política e manter a ordem pública.

O desfecho da situação dependerá da capacidade das partes envolvidas em dialogar e encontrar uma solução que responda às exigências de justiça eleitoral, estabilidade social e inclusão política. Para já, o regresso de Venâncio Mondlane promete marcar um novo capítulo na história de contestação política em Moçambique, num momento que pode definir o rumo do país nas próximas décadas.

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