Inclusão Financeira com Risco Elevado: Microfinanças e Casas de Câmbio no Foco da Supervisão

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O Relatório de Avaliação Sectorial 2025 classifica o subsector das Instituições de Microfinanças, Cooperativas de Poupança e Crédito e Casas de Câmbio como de risco elevado em matéria de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, apontando lacunas de supervisão, deficiências de controlo e vulnerabilidades tecnológicas.

Questões-Chave:
  • O subsector de Microfinanças, Cooperativas e Casas de Câmbio é classificado como de risco elevado no Relatório de Avaliação Sectorial 2025;
  • As principais vulnerabilidades incluem controlo insuficiente de clientes (KYC), fragilidade de supervisão, deficiências na gestão de risco e falta de integração tecnológica;
  • As Casas de Câmbio continuam a apresentar risco intrínseco elevado devido ao volume de transacções em numerário e à exposição cambial;
  • A inclusão financeira promovida pelas microfinanças é considerada positiva, mas expõe o sistema a riscos acrescidos de abuso e infiltração criminal;
  • O relatório recomenda o reforço da regulação prudencial e tecnológica, o licenciamento rigoroso e a cooperação interinstitucional efectiva entre o Banco de Moçambique, UIF e IGEPE.

O Relatório de Avaliação Sectorial 2025 apresenta um diagnóstico rigoroso e preocupante sobre o subsector das Instituições de Microfinanças, Cooperativas de Poupança e Crédito e Casas de Câmbio, classificando-o como de risco elevado em matéria de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo (BC/FT). Embora o sector desempenhe um papel central na inclusão financeira, as deficiências de controlo interno e de supervisão continuam a expor o sistema a riscos de integridade e de reputação significativos.

O documento, elaborado no âmbito da Estratégia Nacional de Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento ao Terrorismo, indica que o crescimento do sector de microfinanças e das cooperativas tem sido acompanhado por uma expansão desigual da capacidade de supervisão.
Com mais de 300 instituições registadas e dezenas de cooperativas de crédito activas em zonas rurais, o sector tornou-se uma das principais portas de acesso a serviços financeiros, mas também uma rota alternativa para fluxos de capitais de origem não verificada.

“A inclusão financeira não pode ser confundida com ausência de controlo”, observa o relatório, sublinhando que “a ausência de mecanismos robustos de identificação e monitorização de clientes em pequenas instituições cria brechas significativas de risco”.

As Instituições de Microfinanças (IMFs) operam, em larga medida, num ambiente de baixo escrutínio tecnológico, recorrendo ainda a processos manuais de recolha e verificação de dados, o que dificulta a detecção de transacções suspeitas. A maioria das IMFs carece de sistemas electrónicos integrados com a Unidade de Informação Financeira (UIF), e muitas não reportam de forma regular.

O relatório assinala também que as Cooperativas de Poupança e Crédito (CPCs), embora cumpram um papel social importante, enfrentam “desafios de governação interna, controlo de membros e insuficiência de auditoria independente”.

“Algumas cooperativas operam de forma informal, sem cumprimento pleno dos requisitos prudenciais e sem mecanismos adequados de verificação de origem de fundos”, lê-se no documento.

Casas de Câmbio: O elo mais vulnerável

As Casas de Câmbio figuram entre as entidades de maior risco intrínseco dentro do subsector.
O relatório considera que o volume de transacções em numerário, a conversão frequente entre divisas e a exposição a fluxos transfronteiriços elevam o risco de branqueamento.

Em várias casas de câmbio, foram identificadas falhas nos registos de transacções, ausência de mecanismos eficazes de verificação de identidade, e deficiências de reporte de operações suspeitas à UIF.

“A natureza intensiva em numerário e o reduzido nível de automatização do controlo tornam as casas de câmbio vulneráveis à utilização indevida por redes criminosas e à movimentação de fundos de origem ilícita”, alerta o relatório.

Em particular, nas regiões fronteiriças e nas províncias com elevada circulação de mercadorias (como Sofala, Tete e Niassa), as casas de câmbio são frequentemente utilizadas para conversão de grandes volumes de moeda estrangeira, com baixo rasto documental e fraca capacidade de supervisão in loco.

Avaliação Final de Risco

O relatório atribui ao subsector uma classificação de risco global “Elevado”, com uma pontuação média ponderada acima de 0,75 numa escala de 0 a 1.

Os factores que mais contribuem para esse nível são:

  • Risco intrínseco elevado, derivado do uso intensivo de numerário e da informalidade operacional;
  • Exposição ao risco geográfico, em zonas com fraca presença de autoridades e elevado fluxo transfronteiriço;
  • Baixa capacidade institucional e tecnológica;
  • Supervisão limitada e fragmentada, com poucos recursos humanos e técnicos dedicados;
  • Falta de relatórios regulares de conformidade e de auditoria independente.

O Relatório de Avaliação Sectorial 2025 reconhece, no entanto, esforços em curso. O Banco de Moçambique tem reforçado a monitorização prudencial e exigido maior rigor no licenciamento, incluindo a obrigatoriedade de planos de mitigação de risco e auditorias externas periódicas. A UIF e o IGEPE trabalham em conjunto para normalizar a partilha de informação e dados transaccionais, especialmente em zonas rurais e periurbanas.

“Os riscos são elevados, mas mitigáveis. O caminho passa por uma regulação inteligente, proporcional e centrada no risco”, conclui o relatório. “É essencial digitalizar processos, capacitar instituições e estabelecer uma cultura de conformidade que não dependa apenas de obrigações legais, mas de princípios éticos e operacionais.”

Contexto e Perspectiva:

O subsector é considerado essencial para a inclusão financeira e o financiamento comunitário, particularmente em áreas onde a banca formal não tem presença física.
Entretanto, a ausência de interoperabilidade, a formação insuficiente dos agentes e a dependência do numerário colocam desafios sérios à integridade do sistema financeiro nacional.

As instituições de microfinanças desempenham um papel determinante na promoção da poupança e do crédito para pequenos empreendedores, mas o seu potencial pode ser comprometido pela vulnerabilidade à infiltração de fundos ilícitos, o que coloca em causa não apenas a sua credibilidade, mas também a estabilidade macrofinanceira.

“A consolidação da inclusão financeira só será sustentável se for acompanhada por uma cultura de integridade”, destaca o relatório.

O Relatório de Avaliação Sectorial 2025 conclui que o subsector das Microfinanças, Cooperativas e Casas de Câmbio combina um duplo paradoxo: é simultaneamente motor de inclusão e porta de vulnerabilidade.
O risco global é Elevado, e o país deve adoptar medidas correctivas urgentes para equilibrar a promoção do acesso financeiro com o reforço da integridade e da supervisão.

As recomendações incluem:

  • Digitalização plena dos processos de identificação e monitorização;
  • Integração das instituições com a UIF e o Banco de Moçambique;
  • Capacitação contínua dos agentes financeiros e auditores;
  • E cooperação internacional reforçada, sobretudo nas zonas de fronteira e corredores logísticos.

“Sem reforço da integridade, a inclusão corre o risco de se tornar vulnerabilidade. O desafio é garantir que o acesso ao sistema financeiro não se transforme numa brecha para a economia informal e criminal”, conclui o relatório.

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