Retoma do apoio financeiro depende da “vontade das autoridades”

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O estabelecimento de um programa de apoio financeiro mais alargado ao Governo depende do interesse das autoridades moçambicanas, explica Alexis Meyer-Cirkel, representante residente do Fundo Monetário Internacional (FMI).

O FMI e os credores internacionais suspenderam a ajuda à Moçambique em 2016, na sequência da descoberta de dívidas de pelo menos dois mil milhões de dólares contraídas por três empresas com garantias do Estado, em 2013 e 2014, sem o conhecimento do parlamento e parceiros.

Desde a interrupção do apoio ao Orçamento do Estado, a instituição financeira internacional tem reiterado que a retoma do mesmo está condicionada à clarificação do uso do dinheiro das dívidas não declaradas que o País contraiu ao Credit Suisse e VTB da Rússia, não adiantando qualquer informação sobre a provável data do fim da suspensão, embora continue a dar ajudas.

Falando ao “O.Económico”, Alexis Meyer-Cirkel explicou que o Fundo tem prosseguido com os apoios ao País, destacando dois desembolsos financeiros realizados no âmbito da Facilidade Rápida de Crédito (RCF, na sigla inglesa) visando suprir os elevados défices orçamentais e de financiamento externo decorrentes das necessidades de reconstrução após os ciclones Idai e Keneth e as necessidades urgentes da balança de pagamentos e fiscais decorrentes da pandemia COVID-19, no entanto, tudo fora de um programa financeiro mais amplo e estruturado.  

“As autoridades indicaram interesse em negociar um novo programa de mais longo prazo”, avançou Meyer-Cirkel, explicando que a materialização do referido programa está condicionada às discussões com o Governo, das quais deverá resultar um “arcabouço de planos e metas para permitir um crescimento contínuo”, pelo que, vão depender muito da “vontade das autoridades”, frisou.

Instado a comentar sobre os condicionalismos para a retoma do apoio ao Orçamento, Meyer-Cirkel reconhece que, desde o episódio das dívidas ocultas, houve um “trabalho extenso” por parte das autoridades em resolver problema de governança e tentar fortalecer as instituições, no entanto, o cumprimento das metas do Relatório sobre Transparência, Governação e Corrupção, elaborado pelo Governo de Moçambique em 2019 com a Assistência dos Departamentos Jurídico e de Finanças Públicas do FMI, com prioridades de reformas em áreas consideradas estruturantes, tem um papel de relevo nas discussões sobre a estruturação do novo programa de apoio.

Enquanto prosseguem as discussões sobre o programa financeiro, vão sendo consolidadas as relações do Fundo com o País nos outros pilares de cooperação que, além do engajamento financeiro, compreendem a análise económica-fiscal e a assistência técnica. Com efeito, avançou, está a entrar na etapa final uma análise macro-fiscal do país que deverá ser lançada até primeiro trimestre de 2022, um trabalho relativo à auscultação dos Estados-membros no âmbito do “Artigo quatro” dos estatutos do FMI.

_Manutenção da paz é crucial para um crescimento sustentado

Comentando sobre as perspectivas de crescimento e desenvolvimento económico do País, Meyer-Cirkel frisou que a manutenção da paz é impreterível para colocar a economia na rota de um crescimento continuado e sustentado de médio e longo prazo. “Primeiramente, o que precisa ser evitado são conflitos, deslocamentos. Então, precisamos ter bastante cuidado em manter a paz”, ajustou.

Outrossim, considerando que estamos numa fase de retoma gradual da economia, com uma recuperação frágil, é importante gerir as fragilidades fiscais, alertou, explicando que, à semelhança de várias economias africanas, a actual situação do País é traduzida por um trilema: um endividamento alto, pressão sobre as receitas e despesas crescentes.

Apesar de reconhecer que as receitas do gás irão diversificar o envelope de recursos do Governo, aliviando o endividamento, Meyer-Cirkel defende que o País precisa de instituições fortes para assegurar um boa gestão das referidas receitas.

Assista a entrevista na íntegra: